Alguns de meus alunos, provavelmente por falha minha, chegam ao terceiro ano do Ensino Médio com uma certa falta de clareza em relação a diversos conceitos da Literatura que são básicos para discussões e análises de textos literários.
Mais do que isso, tais conceitos são muito importantes para provas de vestibular e ENEM, equiparando-se às fórmulas existentes nas ciências exatas, pois são as ferramentas utilizadas na resolução das questões.
Pensando nesse problema, elaborei uma lista de 26 termos literários imprescindíveis para o estudo da disciplina.
Você que é aluno poderá consultar sempre que quiser e você que é professor poderá utilizar como material em sala de aula como forma de melhorar o entendimento por parte de seus estudantes, que poderão estudar MENOS, mas de forma otimizada.
É importante salientar, no entanto, que essa é uma parte pequena de uma boa preparação. Se você vai fazer o ENEM neste ano, não deixe de ler meu guia sobre como estudar para o ENEM do jeito certo.
Índice
Denotação/Conotação
Existem duas formas de usar a linguagem.
A mais simples é aquela que usamos em nosso dia a dia, na qual as palavras têm somente um significado e nenhum outro: aquele encontrado no dicionário. Chamamos isso de linguagem denotativa ou denotação. Em notícias de jornais e textos “sérios” encontramos esse tipo de linguagem.
Existe, porém, na literatura, um tipo de linguagem em que as palavras podem assumir vários significados, dando margem para interpretações diversas. Esse uso específico da linguagem é chamado de conotação. Encontramos essa forma em qualquer poema de qualidade. Veja um de meus exemplos preferidos, um trecho do poema Violões que Choram, do simbolista Cruz e Souza:
E sons soturnos, suspiradas magoas,
Mágoas amargas e melancolias,
No sussurro monótono das águas,
Noturnamente, entre ramagens frias.Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
Gêneros Épico/Lírico/Dramático
Foi Aristóteles em sua obra Poética quem definiu os 3 gêneros clássicos da literatura, todos diretamente associados à poesia.
Mas o que é um gênero literário? De modo geral, é um jeito de escrever o texto literário, é um conjunto de características que estão presentes em um texto.
O gênero épico caracteriza-se pela presença de um herói representativo de um povo ou nação, sendo responsável por feitos grandiosos — inesperados a princípio — que elevam a glória daqueles a quem representa.
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Os exemplos clássicos são as obras de Homero: Ilíada e A Odisseia. Em português, temos o incrível Os Lusíadas, de Luís de Camões. Todas essas são escritas em verso, como os gregos antigos tanto gostavam. Um exemplo em prosa e mais moderno é a trilogia de Tolkien, O Senhor dos Anéis.
O gênero lírico está associado a textos de caráter emocional, centrados na subjetividade dos sentimentos da alma. Poético, não é? Então lembre-se de que quando o texto falar muito dos sentimentos do eu-lírico, ele pertencerá a esse gênero.
Muitos poemas pertencem a esse gênero, sendo os mais significativos os pertencentes ao período do Romantismo na Literatura. Eu gosto especialmente da obra do brasileiro Álvares de Azevedo.
O gênero dramático, por fim, foi definido pelo grande filósofo grego como o gênero em que os textos são escritos para serem representados em forma de peça de teatro, que naquela época dividia-se em tragédia e comédia.
Tragédia/Comédia
A tragédia era o gênero mais nobre na Grécia antiga, normalmente representando a ascensão e queda de um herói — no sentido de que ele era o máximo e acaba se dando MUITO mal.
Sou um fã incondicional da mais famosa delas, a peça Édipo Rei, de Sófocles.
A comédia, por outro lado, era considerado um subgênero pobre, sem valor, representando normalmente os vícios e defeitos do ser humano comum, tendo como alvo preferido os governantes. Não é necessário você saber muito mais do que isso sobre ela.
Eu-lírico/Eu-poético
Sabe quando a gente vai ler poesia e pensa “O que será que o poeta/autor quis dizer com isso?”. Na verdade, essa voz que fala no poema não pode ser chamada de poeta ou autor.
Imagine que eu escreva um poema em que há uma mulher falando de seu amor por um homem. Isso faria de mim um homossexual? Não.
É por isso que chamamos essa voz de eu-lírico ou eu-poético. É preciso separar “o cara que escreveu” da “voz que fala no poema”.
Lembre-se sempre que, como dizia Fernando Pessoa:
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Subjetividade
A subjetividade não é o contrário de objetividade. Elas não têm nenhuma relação entre si.
Na poesia, aquilo que é subjetivo tem a ver com o que é interior, emocional do eu-lírico, ou seja, tem a ver com seus sentimentos. Vejam que a palavra é bem parecida com sujeito. Isso não é por nada. O que é subjetivo é relativo aos sentimentos de algum sujeito.
Métrica
Em poesia, a métrica tem a ver com o número de sílabas poéticas de cada verso. Hoje em dia não se dá muita bola pra isso, mas antigamente um poeta só era bom se em seu poema todos os versos tivessem o mesmo número de sílabas. Isso servia essencialmente para criar o ritmo do poema, da mesma forma que encontramos na música.
Há uma infinidade de classificações para os tipos de versos conforme as métricas. Isso você pode encontrar aqui.
Vale lembrar que as sílabas poéticas não são as mesmas que as sílabas gramaticais. Para encontrar as primeiras é preciso realizar um processo chamado escansão.
Escansão
É o processo de separação dos versos em sílabas poéticas. Você pode aprender como fazer aqui.
Refrão/Estribilho
Todos sabemos que na música sempre há um trecho que se repete, contribuindo para que a memorização fique mais fácil. Na poesia isso também existe, mas o nome técnico é estribilho.
Vejamos um exemplo em um cantiga de amigo do Trovadorismo português:
Ai flores, ai flores do verde pino,
se sabedes novas do meu amigo!
ai Deus, e u é?Ai flores, ai flores do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado!
ai Deus, e u é?Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs comigo!
ai Deus, e u é?Se sabedes novas do meu amado, A
aquel que mentiu do que mi há jurado!
ai Deus, e u é?
Foco narrativo
O foco narrativo tem a ver com o tipo de narrador que uma determinada história tem. Existem nomes técnicos para cada tipo, mas o importante é você entender o conceito e lembrar das duas possíveis variáveis:
- A história é narrada em 1ª pessoa (eu/nós) ou em 3ª pessoa (ele/eles)
- O narrador participa da história ou não.
Com essas opções formam-se 4 tipos de narrador, a partir de suas combinações. Para o ENEM, isso é tudo que você precisa saber.
Personagem plano/esférico
Há dois tipos de personagens nas narrativas.
Os planos são aqueles com pouco ou nenhum desenvolvimento em torno de seus aspectos psicológicos. Não há nada em especial pelo qual ele poderá ser lembrado. Costumam ser compostos por tipos humanos: a lavadeira, o padeiro, o padre, a prostituta, o malandro, o rico e muitos outros.
Personagens esféricos, por outro lado, apresentam grande desenvolvimento psicológico, sendo lembrados por sua individualidade. Quem não sabe quem foi Capitu, por exemplo?
Enredo/Trama
É a história em si. Os acontecimentos narrados e tudo que está atrelado a eles. Pense na história como uma rede, uma teia. Aí você entenderá o porquê da palavra.
Cânone
Há livros que resistem ao teste do tempo e continuam sendo lidos, estudados por especialistas e republicados por editoras. Esses livros recebem o adjetivo de cânones. Há diversas listas publicadas em outros livros e também pela internet.
Romance/Novela/Conto
A divisão entre romance, novela e conto não depende apenas do número de páginas, mas também de como as narrativas se organizam.
Um romance costuma ter diversos núcleos narrativos e diversos personagens esféricos, todos relacionados a um núcleo principal. Lembre-se que o termo romance em nada tem a ver com a ideia de história de amor, por isso há romances policiais, romances góticos, romances realistas e muitos outros.
A novela tem uma trama mais simples que o romance e, normalmente, núcleos que têm pouca ou nenhuma relação entre si — basta pensar nas novelas da televisão para entender. Há várias personagens planas e o tempo costuma transcorrer de forma linear, algo que no romance é muito variável.
O conto é o tipo de narrativa mais condensado, possuindo apenas um núcleo e poucos personagens. Apesar do tamanho, apresenta grande dificuldade de composição, já que tudo precisa ser muito bem escolhido para que o leitor leia até o final.
Clímax
Toda narrativa tem um ponto alto, em que a tensão atinge o máximo e algo acaba por acontecer. Os melhores contistas utilizam esse elemento com maestria. Esse ponto alto leva o nome de clímax, podendo ser, inclusive, representado por um gráfico.
Metáfora/Ambiguidade/Ironia
Em língua portuguesa há uma infinidade de figuras de linguagem. As que eu considero primordiais para a interpretação de textos literários e para resolução de questões de provas são essas três.
A metáfora é a rainha das figuras de linguagem e foi lindamente conceituada no filme O Carteiro e o Poeta, na cena abaixo.
Simplificando, a metáfora é uma comparação por semelhança, sem o uso da palavra “como”. Evidentemente, ela assume formas mais complexas quando usada por poetas canônicos como Pablo Neruda.
A ambiguidade é a figura que estabelece o duplo sentido. Não confunda, no entanto, sentido com interpretação. Quando falamos de sentido, falamos de algo que está dito de forma explícita no texto ou frase. A interpretação é algo que vai além do significado “cru” das palavras. Veja algumas frases ambíguas:
- Estivemos na escola da cidade que foi destruída pelo incêndio. (A escola ou a cidade?)
- O policial prendeu o ladrão em sua casa (Do policial ou do ladrão?)
- Você deve esperar seu irmão e levá-lo em seu carro até o hospital. (De quem é o carro?)
A ironia é algo tão presente em textos que nem precisaria ser explicada. Todo mundo sabe que ela consiste em dizer o contrário do que realmente se pensa, com uma dose de humor. Que tal a charge abaixo?
Aliteração/Assonância
As figuras sonoras, por sua vez, também desempenham um papel importante na literatura, principalmente na poesia. Depois da rima, ainda há duas outras que devemos saber.
A aliteração é a repetição de sons consonantais. Geralmente essa repetição gera um efeito sonoro marcante, que se relaciona diretamente com o que está sendo dito no poema. Um exemplo é a aliteração da consoante /v/ no poema de Cruz e Souza que vimos ao falar da conotação.
A assonância, por outro lado, é a repetição de sons vocálicos, também com algum objetivo que extrapola a simples reprodução sonora. Cruz e Souza, novamente, vem com um exemplo fantástico no poema Antífonas (trecho):
Ó formas alvas, brancas, Formas claras
De luares, de neves, de neblinas!…
Ó Formas vagas, fluídas, cristalinas…
Incensos dos turíbulos das aras…Formas do Amor, constelarmente puras,
De Virgens e de Santas vaporosas…
Brilhos errantes, mádidas frescuras
E dotências de lírios e de rosas…
Após ler e apropriar-se desses conceitos, seu entendimento das explicações e análises sobre textos literários será muito melhor.
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